De vez em quando, o #DiretoDoVale foge do tema “Empreendedorismo do Vale Do Silício para o Brasil”. Hoje vamos falar de churrasco e barbecue.
Nesse final de semana, os EUA comemoram o Dia da Independência. Essa comemoração invariávelmente ocorre em torno de uma churrasqueira. Aqui na California, o feriado de 4 de Julho é o auge do verão e o dia em que se acende a grelha no quintal e se convida os amigos para uma cerveja e… um churrasco.
Comer carne é parte importante da cultura e da dieta brasileira e americana. Como nasci no Brasil, moro na California, visitei a Australia (outro pais com tradição churrasqueira) e já passei um tempo no Alabama (onde barbecue tem outro significado), já vi muito mal-entendido quando o assunto é comer carne.
Então, antes de sair para o meu BBQ de quatro de julho, sentei aqui para esclarecer algumas dessas confusões.
Primeiro, a carne
O boi americano é genéticamente diferente do boi brasileiro. O brasileiro tem mais “Zebu” (originado na India) enquanto o boi americano tem mais “Taurino” (originado na Europa). Os métodos de criação de gado nos EUA são mais intensivos, com o boi confinado e alimentado com milho e outros grãos.
O resultado é que a carne bovina americana é mais gordurosa, mas macia e provavelmente menos saudável. No sistema de classificação do USDA (Departamento de Agricultura), uma carne tem graduação mais alta quando tem mais “marbling” (gordura misturada na carne, resultado da alimentação com grãos).
Os cortes de carne nos EUA também são diferentes. Alcatra é “Eye Round”. Contra-Filé é “Strip Steak/Rib Eye”. Maminha é “Tri-Tip”.
Picanha é difícil de encontrar (porque ele acaba dividido e misturado com outros cortes), mas quando se acha, é “Top Sirloin”. O Top Sriloin aqui acaba em espetinhos vendidos no canto da geladeira do supermercado. Mas nos últimos anos a colônia Brasileira tem treinado os vendedores de carne locais. Se você entrar em um supermercado no Vale e falar com o açougueiro atrás do balcão, e explicar: “sou Brasileiro, e quero uma peça da ponta do top sriloin, sem remover a capa de gordura”, tem chances dele dizer “ah, você quer um corte de picanha”.
Confusão, confusão
No Brasil, nós comemos “bife” (uma porção de carne, cortado em um filé fino, normalmente frito na panela ou chapa e servido no prato) ou “churrasco” (normalmente assadas no espeto ou na grelha e fatiadas no momento de servir).
Imagino que “bife” é uma tradução mal-feita de “beef” a palavra em inglês para designar carne bovina. Bife aqui é “steak”.
“Barbecue” é uma palavra usada nos paises de língua inglesa para o aparato para se cozinhar carne (a “churrasqueira”) ou o evento onde se prepara carne na grelha (a “churrascada”).
Mas no sul dos EUA “Barbecue” (BBQ) tomou significado próprio. É uma forma específica de se preparar carne (normalmente suína): a carne é defumada e cozida em temperatura baixa por várias horas até ficar bem macia (“fall off the bone”) e servida com um molho doce a base de tomate, vinagre e acúcar (“BBQ sauce”).
- Carne = Beef
- Bife = Steak (maior e mais grosso que bife)
- Churrasqueira = Barbecue (fora dos EUA)
- Churrasqueira = Grill (EUA)
- Churrasco = Barbecue (California)
- Carne desfiada com molho = Barbecue (EUA)
- Não coloque molho BBQ no bife ou churrasco
Então, como se come carne nos EUA?
Enquanto no Brasil tem gente que come um “bife” quase todo dia, nos EUA, quem come carne no dia-a-dia, normalmente o faz na forma de hamburger no restaurante fast-food.
O “steak” americano é um pedaço substancial de carne (normalmente 300-500g) de uns 3cm de altura, temperado com sal e pimenta do reino, preparado na grelha e servido ao ponto. É como se come carne quando se vai a um “steak house”.
Os cortes melhores e mais populares são o “Rib Eye Steak” ou o “NY Strip Steak” (ambos em torno do contra-filé).
Quando se pede carne em um restaurante, você vai ouvir a pergunta “How do you want your steak cooked?” As respostas esperadas são “rare” (tostado fora, cru por dentro), “medium-rare” (ao ponto, que é o ponto certo), ou “medium” (um pouco mais passado que ao ponto). Se você disser “medium-well” ou “well-done” (bem passado), corre o risco de ser chutado para fora do restaurante (o que seria bem merecido).
A imagem que americano come “hamburger e hot dog” é correta até certo ponto, mas é normalmente distorcida para indicar que americanos não entendem de carne (o que não é verdade).
No churrasco do quintal, hot dogs são para as crianças. Além dos “steaks”, o corte mais comum para se assar carne na grelha em peça inteira é o “tri-tip”.
Nos EUA, o termo “Barbecue” pode ser usado como o brasileiro usa “churrasco” (uma reunião onde se prepara carne na grelha), mas também indica um jeito específico de se preparar carne no sul (defumada, assada em fogo baixo por horas, servida com molhos doces).
Preste atenção no contexto. Se estiver na California e te convidarem para um BBQ no quintal, provavelmente é um churrasco como você está acostumado. Se perguntarem se “voce gosta de BBQ?” ou convidarem para ir a um “BBQ restaurant”, isso significa outra coisa.
Colocar molho BBQ no steak é confusão de Californianos que não entendem de carne e que (pasmem) as vezes é copiado em outros lugares por gente desinformada. Em boas steak-houses, pedir “BBQ sauce” é ofensa ao mestre churrasqueiro.
Churrascarias, ou “Brazilian Steak Houses” ficaram comuns nos EUA nos últimos anos. O Fogo de Chão (que tem mais restaurantes nos EUA que no Brasil) e outra cadeias brasileiras tem restaurantes na maioria das capitais americanas. O americano sofre tentando pronunciar “churrascaria”, mas gosta da experiência.
